O Desafio de Construir Um Espaço Sagrado
 
 
Carlos Cardoso Aveline
 
 
 
 
 
O teosofista indiano B. P. Wadia escreveu em um dos seus livros que, segundo os Vedas, o lar de um indivíduo é o seu maior Ashram [1].
 
Assim como todos os rios e cursos d’água fluem para descansar no Oceano,  assim também todos os Ashrams fluem para descansar na família (VI, 89-90). “Construir um Lar como deve ser construído”, escreve o sr. B.P. Wadia, “é trazer para a terra o Reino dos Deuses”.[2]
 
Não há apenas uma alquimia do indivíduo. Existe também uma alquimia dos relacionamentos mais profundos do ser humano. A casa de cada um é o centro magnético mais forte da sua vida. O  indivíduo deve tomar medidas práticas para que o local em que mora seja, de fato, um templo.
 
As emoções pessoais precisam estar em paz e em ordem para que o foco da consciência se estabeleça nos planos superiores da mente. As equações pessoais devem ser simplificadas. O magnetismo de cada ser humano fica impresso e registrado nas paredes e objetos da casa que ele habita: se sua vontade for correta e elevada, será maior a componente sagrada da casa. 
 
A qualidade magnética da moradia dependerá também de alguns fatores ecológicos e do contato mais ou menos favorável da casa com o meio ambiente natural, inclusive em planos sutis. Não tem importância se um bem imóvel é pobre ou rico, mas  deve haver simplicidade nele.  A atmosfera da moradia reflete o estado de espírito do morador. O índice de autoconhecimento e o grau  de contato de cada habitante com o seu próprio eu superior são dois fatores decisivos, que a teosofia original ensina como podem ser ampliados.
 
A matriz básica do carma e das emoções da humanidade está impressa no casal. Deste relacionamento surgem as crianças. Ele determina o rumo das civilizações. É possível perceber o presente e o futuro de uma  civilização observando o estado psicológico das famílias. O casal humano forma o “vínculo fundamental” de qualquer sociedade. Portanto, a sua qualidade deve ser tão alta quanto possível.  Uma boa moradia pode ser construída – nos planos sutis – como um templo. A sua atmosfera refletirá o estado do santuário que há no coração dos seus moradores. Os  membros de um casal são as duas principais colunas – yin e yang – do templo da moradia.
 
Ao longo do caminho espiritual,  deve haver uma transformação purificadora das relações íntimas, de modo que um tipo mais profundo e impessoal de amor possa, à medida que o tempo passa, ganhar força crescente na combinação de fatores que forma o vínculo emocional.  Deste modo ninguém envelhecerá em vão.
 
Em “Cartas dos Mestres de Sabedoria”, pode-se ler palavras interessantes de um Mestre sobre o tema das relações afetivas.  É preciso levar em conta que o termo “Ain-Soph”, mencionado pelo sábio,  é o equivalente ocidental de “Parabrahman”. A expressão significa o puro Espaço Universal e Abstrato. Qualquer personificação de Ain-Soph, portanto, só pode ser encarada como uma imagem meramente simbólica. Ele nada tem a ver com a ideia de algum deus monoteísta.
 
Diz o Mestre:
 
“Saiba, Irmão meu, que onde um amor verdadeiramente espiritual busque consolidar-se através de uma união pura e permanente de duas pessoas,  no sentido terreno, não há pecado nem crime aos olhos do grande Ain-Soph, pois esta é somente a repetição divina dos Princípios Masculino e Feminino – o reflexo microcósmico da primeira condição da Criação. Diante de uma tal união os anjos bem poderão sorrir! Mas uniões como estas são raras, Irmão meu, e podem ser criadas apenas sob a sábia e amorosa supervisão da Loja, de modo que os filhos e filhas do barro não possam ser totalmente degenerados e que o Amor Divino dos Habitantes das Esferas Superiores (Anjos) para com as filhas de Adão seja repetido. Mas mesmo eles devem sofrer antes de serem recompensados.  O Atma de um homem pode permanecer puro e altamente espiritual enquanto está unido com seu próprio corpo material; por que não poderiam duas almas, em dois corpos, permanecer puras e incontaminadas apesar da passageira união terrena dos últimos?” [3]
 
Em outra carta, também abordando o tema do casal, o mesmo sábio escreveu:
 
“A pureza do amor terreno purifica e prepara para a realização do Amor Divino. Imaginação humana alguma pode conceber os ideais da divindade a não ser através daquilo que lhe é familiar. Aquele que se prepara para compreender o Infinito deve compreender antes o finito.  O Ideal do Espiritual pode penetrar somente através da imaginação, que é o caminho condutor e o primeiro portal para as concepções e impressões do Atma terreno.” [4]
 
Portanto, a casa em que vivemos é no mínimo um templo em potencial, a ser melhor construído à medida que nossa consciência se amplia. A vida familiar pode refletir a energia que flui do santuário interno na consciência de cada um. Deste modo se faz uma ponte eficaz entre o céu e a terra, e a fonte da felicidade começa a ser reconhecida de modo mais nítido.
 
NOTAS:
 
[1] Ashram – comunidade mística, local de retiro de seres dedicados à busca da verdade.
 
[2] “The Building of the Home”,  de B. P. Wadia, Theosophy Company (India), Mumbai, 2005, 56 pp., ver p. 03.  O sr. B.P. Wadia (1881-1958) é um dos maiores autores e pensadores da Loja Unida de Teosofistas e do movimento teosófico como um todo.
 
[3] “Cartas dos Mestres de Sabedoria”, editadas por C. Jinarajadasa, Ed. Teosófica, Brasília, 1996, 296 pp., ver Carta 19 da segunda série, p. 190.
 
[4] “Cartas dos Mestres de Sabedoria”, obra citada, ver Carta 18 da segunda série, p. 189.
 
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O texto acima foi publicado inicialmente em inglês em nossos websites associados. Título original: “Turning a House Into a Temple”.
 
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Em setembro de 2016, depois de cuidadosa análise da situação do movimento esotérico internacional, um grupo de estudantes decidiu formar a Loja Independente de Teosofistas, que tem como uma das suas prioridades a construção de um futuro melhor nas diversas dimensões da vida.
 
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O grupo SerAtento oferece um estudo regular da teosofia clássica e intercultural ensinada por Helena Blavatsky (foto). 
 
 
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