Busca da Sabedoria Desperta Paz Incondicional
 
 
Carlos Cardoso Aveline
 
 
 
 
 
Viver como os sábios vivem. Agir corretamente, e assim conhecer as possibilidades ilimitadas do nosso eu superior, nossa alma imortal. Esta ciência deveria ser estudada desde as escolas de primeiro grau até os níveis de pós-graduação das universidades.
 
No ensino convencional, os estudantes aprendem uma combinação de coisas úteis e inúteis. Grande parte do aprendizado é fútil. São obrigados a colocar informações na sua memória para passar de ano. Enquanto estudam algo novo, esquecem aquilo que haviam memorizado no mês passado.
 
A capacidade de atenção e concentração dos alunos é baixa porque seus problemas emocionais são grandes. A mesma desorientação marca mais tarde a vida profissional e familiar. Como se pode viver da maneira mais correta possível?
 
A Teosofia não é uma disciplina como História ou Geografia, em que se tem êxito apenas acumulando dados e informações. O aprendizado da vida precisa recomeçar sempre a cada dia. Você nunca pode afastar-se do nível básico. Se pensar que sabe muito, é porque esqueceu o fundamental.
 
Para viver a filosofia esotérica é preciso não aprender certas coisas, como a mentira, e desaprender outras, como o egoísmo. Você terá de ser um autodidata. Deve ser seu próprio mestre, decidindo o que incorpora e o que não incorpora ao seu universo pessoal.
 
Há incontáveis caminhos e disciplinas ensinando a ciência da vida a milhões de pessoas com diferentes temperamentos, idades e formações culturais. Não existe uma fórmula dogmática e única para todos em qualquer momento da vida. O caminho se faz ao andar, como diz o poeta espanhol Antonio Machado. Quando ficamos presos a um pedaço limitado da sabedoria humana, nosso horizonte se estreita e a falsa sensação de segurança causada pela rotina mental logo passa a asfixiar-nos. “Há doutrinas que são como a vidraça da janela”, escreveu Gibran Khalil Gibran. “Vemos através delas, mas elas nos separam da verdade.”[1] Por isso é sábio pensar por nós próprios e incorporar à nossa vida o que vemos de melhor em cada religião, ciência e filosofia.
 
A seguir trago para reexame do leitor algumas ideias básicas da antiga ciência de viver. O método de aprendizagem é experimental: o laboratório prático é a existência diária de cada um.
 
1) Estar de Bem com a Vida só Depende de Você
 
“Tudo o que somos é resultado do que nós pensamos no passado”, diz o Dhammapada: “tudo o que somos se baseia em nossos pensamentos e é formado por nossos pensamentos. Se alguém fala ou age com pensamento puro, a felicidade o acompanha assim como sua própria sombra, que nunca se afasta dele.” [2]
 
Você não precisa pedir desculpas por estar contente com a vida. O contentamento é incondicional.  Pare sua leitura agora por um instante. Feche os olhos. Respire fundo e relaxe.
 
Lembre que no cosmo inteiro reina a paz, a mesma paz que há no fundo do seu coração. Experimente, por um momento, profundamente, esta verdade: “Só o fato de estar vivo é motivo mais do que suficiente para estar de bem com a vida.”
 
O compromisso com nossa própria alma merece ser renovado regularmente. Ele é o primeiro passo para viver com sabedoria.
 
2) Defina a Meta da sua Existência
 
“Trabalho é amor feito visível”, escreveu Khalil Gibran. “Se você não pode trabalhar com amor, mas só com desgosto, é melhor deixar seu trabalho, sentar-se na porta do templo e pedir esmola àqueles que trabalham com alegria.” [3]
 
O objetivo da nossa vida não pode ser alcançado sem esforço. Precisamos trabalhar para obtê-lo.  Mas será que ele está bem claro diante de nós? Foi bem escolhido? Tire um momento para examinar a sua consciência. Defina ou redefina claramente sua meta, antes de trabalhar por ela. Lembre que:
 
A) Quanto mais nobre for sua meta, menos você correrá o risco de sofrer decepções, porque estará livre da ilusão de esperar recompensas; e
 
B) Um dos maiores prazeres que o ser humano conhece é a alegria do dever cumprido.
 
3) Tenha Fé em Si Mesmo e no seu Futuro
 
A confiança em si decorre da interação e do diálogo sem palavras com a alma espiritual. 
 
O estudante sério de teosofia não perde energia com inveja porque tem fé em si próprio. Ele confia na lei universal e no eu superior. Possuindo autoconfiança, sua atitude diante da vida é positiva, e está pronto a ajudar outros.
 
Uma das maiores desgraças que podem ocorrer a um ser humano é a perda do ânimo e da alegria de construir um futuro saudável. Por outro lado, os infortúnios são provisórios, enquanto a nossa conexão com a luz é permanente. O autorrespeito provoca um sentimento de respeito pelos outros: e o respeito pelas pessoas expande nossa autoestima. 
 
4) Integre a Palavra, a Emoção, a Intenção e o Gesto  
 
Os Versos de Ouro de Pitágoras dizem:
 
“12. Nunca faças junto com outros, nem sozinho, algo que te dê vergonha. 13. E, sobretudo, respeita a ti mesmo. 14. Pratica a justiça com teus atos e com tuas palavras. 15. E estabelece o hábito de nunca agir impensadamente.”
  
Algumas linhas mais adiante, os Versos acrescentam:
 
“28. Pensa e delibera antes de agir, para que não cometas ações tolas, 29. Porque é próprio de um homem miserável agir e falar de modo impensado.  30. Mas faze aquilo que não te trará aflições mais tarde, e que não te causará arrependimento.”[4]
 
Viver eficientemente significa agir com integridade. Devemos pensar o que sentimos e sentir o que pensamos, tanto quanto possível. É correto estabelecer uma ligação harmônica entre ação, sentimento e pensamento. O sábio é feito de uma peça só – embora possa ser visto sob ângulos diferentes. É graças à integridade que ele possui paz interior. Sextus, o pitagórico, ensinou:
 
“Viver é algo que não depende de nós, mas viver corretamente, sim.” [5]   
 
Desenvolvendo a força da alma, o peregrino se torna mais forte que a pressão exercida pelo mundo externo. E ele alcança a vitória usando o velho método da tentativa, do erro, e da correção do erro.
 
5) Abra Espaço no Cotidiano para a Busca da Sabedoria
 
A silenciosa luta contra as Causas do sofrimento ocorre ao longo das 24 horas do dia. O discernimento entre verdade e ilusão é fundamental, e um mestre de sabedoria escreveu:  
 
“Como você pode diferenciar o real do ilusório, o verdadeiro do falso? Só através do autodesenvolvimento. Como conseguir isso? Primeiro, precavendo-se contra as causas do autoengano. E isso você pode fazer dedicando-se, em determinada hora ou horas fixas, a cada dia, totalmente só, à autocontemplação, a escrever, a ler, a purificar suas motivações, a estudar e corrigir seus erros, ao planejamento do seu trabalho na vida externa. Estas horas deveriam ser reservadas como algo sagrado para este propósito, e ninguém, nem mesmo o seu amigo ou seus amigos mais íntimos, deveriam estar com você naquele momento. Pouco a pouco sua visão ficará clara, você descobrirá que as névoas se dissipam, que suas faculdades interiores se fortalecem (…) e a certeza toma o lugar das dúvidas.”[6] 
 
Você pode, e merece, dedicar algum tempo para si mesmo todos os dias. Cabe dividir esse tempo entre várias atividades, como ler, meditar, registrar seus pensamentos em um diário e observar os avanços e recuos em seu esforço por viver com sabedoria.
 
Lembre-se: quanto mais você descobrir a luz dentro de si, menos encontrará luz fora. É preciso aprender a dar apoio aos outros sem esperar apoio deles. Não é realista agir corretamente só porque a outra pessoa age corretamente. Fazer o melhor deve ser uma decisão incondicional: caso contrário não teria mérito.
 
6) Saiba Esperar; Avance Lentamente; Evite Todo Excesso
 
“A paciência é a sabedoria da espera”, afirma um ditado chinês. E ainda: “A paciência é uma árvore com raízes amargas e frutos doces.” Freud escreveu que saber esperar é essencial para viver bem. A paciência é tão importante quanto o entusiasmo e a decisão de agir intensamente.
 
As diferentes virtudes são formas externas da mesma sabedoria: andam em grupo e se  complementam umas às outras. Não devemos sintonizar apenas com uma ou duas virtudes,  portanto: necessitamos todas elas, se quisermos viver de modo sábio.
 
É correto trabalhar com tanta intensidade como se buscássemos um resultado imediato e total, mas tendo a paciência de quem não espera ver o resultado desse esforço. Para saber esperar é preciso aprender a calar. Os chineses têm vários provérbios a respeito:
 
“Pense antes de falar, mas não fale tudo o que pensa”;
“O coração do tolo está na boca”; e
“Quem passa o tempo todo falando não tem tempo para pensar”.
 
Por outro lado, a virtude da paciência não é apenas a capacidade de conter ou controlar o sentimento de ansiedade. Ela é o resultado natural de um estado interior de paz.
 
No portal do templo de Delfos, na Grécia antiga, havia diversas inscrições. Uma delas era “Conhece a ti mesmo”; e outra, “Nada em excesso”. A moderação, como o bom senso, é a pedra de toque da busca espiritual e da ciência de viver. Quando se adota uma meta elevada e nobre, surgem logo os perigos da ansiedade e do exagero. “Para viver bem e por muito tempo, seja moderado”, diz um ditado chinês. “A ganância entra no coração para roubar a paz de espírito”, acrescenta outro ditado.  
 
Buddha desenvolveu a doutrina do Caminho do Meio, que evita os dois extremos da indulgência e do ascetismo exagerado. O sábio deixa que os acontecimentos se desenvolvam em seu ritmo natural. Ele guarda sua energia para agir com toda força no tempo, no ritmo e no modo mais adequados.  
 
Com frequência a ação do sábio é imperceptível, porque ele inspira silenciosamente a ação correta nas outras pessoas. “Só sei que nada sei”, dizia humildemente Sócrates, o maior sábio grego. O bom governo, diz o taoismo, ordena as coisas de modo tão natural que ninguém percebe a presença do governante. A função do líder não é estar em evidência o tempo todo, mas dar atenção ao que a  comunidade necessita.
 
7) Faça Exercícios Físicos Moderados Diariamente, ao Ar Livre  
 
Em todo sistema magnético ampliado, o fio-terra é fonte indispensável de segurança. Caminhar constitui uma bênção, portanto. A respiração profunda, que vem com o exercício físico moderado, é uma ideia-chave para viver melhor. Caminhar em ambientes abertos amplia e harmoniza prana, a força vital.[7]
 
A respiração correta põe a coluna vertebral na posição ereta, o que fortalece ao mesmo tempo a sustentação do corpo e a estruturação da consciência. O funcionamento intensificado da respiração otimiza os batimentos cardíacos, atrai emoções elevadas e ajuda a afastar maus pensamentos. Estimula em nós a capacidade de aproveitar as oportunidades que a vida oferece, de aceitar obstáculos com realismo e aprender as lições que permitem evitar sofrimento desnecessário.
 
Somos essencialmente feitos de energia. Além disso, possuímos corpos físicos que pulsam durante algum tempo no oceano da vida de acordo com a lei dos ciclos. A existência humana é um evento passageiro, renovado graças à reencarnação. Ela ocorre através de uma série de  vibrações e ritmos combinados cuja qualidade podemos melhorar nos seus vários níveis de consciência. Caminhar, entre outros exercícios físicos moderados, fortalece a base energética indispensável para que façamos crescer a harmonia com o nosso eu superior, e com o cosmo.
 
NOTAS:
 
[1] “Parábolas”, Gibran Khalil Gibran, Acigi, 132 pp. Ver p. 46. O nome deste autor também é grafado como “Kahlil Gibran”.
 
[2] “O  Dhammapada”, edição completa online disponível em nossos websites associados, ver capítulo um, verso dois.
 
[3] “As Últimas Horas de Gibran”, Gibran Khalil Gibran, Nova Época Editorial Ltda., p. 7.
 
[4] “Os Versos de Ouro de Pitágoras”, de Carlos Cardoso Aveline. O texto está disponível em nossos websites associados.
 
[5] “The Golden Verses of Pythagoras and Other Pythagorean Fragments”, Kessinger Publishing Inc., EUA, 82 pp. Ver p. 48.
 
[6] “Cartas dos Mestres de Sabedoria”, transcritas e compiladas por C. Jinarajadasa, Ed. Teosófica, 295 pp. Ver p. 146.
 
[7] Veja o artigo “A Arte de Passear”, de Carlos Cardoso Aveline. O texto está publicado em nossos websites associados.
 
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Sobre o mistério do despertar individual para a sabedoria do universo, leia a edição luso-brasileira de “Luz no Caminho”, de M. C.
 
 
Com tradução, prólogo e notas de Carlos Cardoso Aveline, a obra tem sete capítulos, 85 páginas, e foi publicada em 2014 por “The Aquarian Theosophist”.
 
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