Dois Instrumentos Necessários à Caminhada Teosófica
 
 
Carlos Cardoso Aveline
 
 
 
 
 
Estudante A:
 
Para alguns, o caminho espiritual parece ser feito exclusivamente de pensamentos positivos. Mas, neste caso, como será possível  identificar e corrigir os erros e defeitos?
 
Estudante B:
 
O estudante que preserva o seu bom senso não perde o sentido crítico. Uma visão exotérica e  emocional do caminho prefere  acreditar na  proposta ingênua de fazer de conta que o mundo é uma maravilha. Mas para cada ingênuo há um espertalhão, quando não é o espertalhão que se faz passar por ingênuo. O aprendiz que  aprende a agir com discernimento desafia as rotinas mentais. Ele mostra as falhas dos sistemas eclesiásticos e da ciência convencional, e propõe as práticas corretas. Ele não teme apontar os erros que devem ser corrigidos, embora saiba que será testado por isso. Ele sabe que não há aprendizado sem testes. 
 
Estudante A:
 
Mas qual é a diferença entre o espírito crítico e o pensamento negativo? Quando é que termina um e começa o outro?
 
Estudante B:
 
Uma primeira  característica fundamental do bom espírito crítico está na intenção. O aprendiz fala dos erros com o propósito interior de que eles sejam corrigidos. A sua intenção não é destruir. As suas críticas nunca se dirigem a pessoas, mas a fatos e ações. E a  crítica ao que é externo anda junto com uma autocrítica honesta.
 
Uma segunda  característica é que o espírito crítico saudável dá o apoio e o realismo necessários  ao pensamento positivo, para que ele possa ter eficiência prática.  Quem possui bom senso sabe que o pensamento positivo é o fundamental e o sentido crítico é o secundário.
 
Uma terceira característica é que o espírito crítico, quando unido ao pensamento positivo, leva o estudante à ação construtiva de longo prazo,  com discernimento e confiança no futuro. A confiança no futuro resulta do contato ampliado com a alma imortal. Ela  permite olhar os  erros de frente sem cair no pessimismo. 
 
Do mesmo modo que um bom médico não faz de conta que o paciente está bem, se o paciente está doente – mas anuncia com honestidade que será necessário este ou aquele tratamento doloroso para superar a doença -,  também a teosofia original não finge que tudo está bem com nossa civilização. Ela mostra honestamente o caminho para corrigir o rumo.
 
Não há melhor carma do que o pensamento voltado ativamente para o bem da humanidade.  Quem deseja o bem da humanidade e é estudante da sabedoria universal faz três coisas básicas:
 
1) Ele formula ou ajuda a formular um diagnóstico adequado. 
 
2) Ele chega a um prognóstico (uma  proposta saudável de futuro). 
 
3) Ele trabalha pela superação das causas do sofrimento; e também pela construção do que é novo. 
 
O pensamento correto não está na superfície da mente ou na simples fala. Sabemos que as palavras amáveis ocultam frequentemente segundas e terceiras intenções. Se palavras agradáveis  fossem suficientes, não haveria qualquer diferença entre o sábio e o mentiroso. Em filosofia esotérica, pensamento correto é aquele que surge de uma Intenção interior que é nobre e elevada.
 
Assim, o pensamento severo e a fala crítica podem ser corretos.  O pensamento agradável e a fala mansa podem ser causadores de grande mau carma e sofrimento.  É a motivação do indivíduo perante a vida, a sua meta central e suas metas auxiliares –  assim como os seus hábitos de pensamento, sentimento e ação – que direcionam e dão valor real ao que ele pensa e diz.
 
Quando o Jesus do Novo Testamento denuncia os “sepulcros caiados” do clero profissional (Mateus 23: 13-27), ou quando expulsa os comerciantes do templo (Marcos 11: 15-18), o seu discurso e o seu pensamento rigorosos têm efeitos positivos, porque a Intenção  é nobre, e a ação é sábia. A teosofia ensina equilíbrio e rigor. O senso crítico e o pensamento positivo são dois instrumentos igualmente indispensáveis, que funcionam como os pratos de uma balança. A sua combinação correta indica o caminho da paz.  
 
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Uma versão inicial do texto acima foi publicada de modo anônimo em “O Teosofista”, edição de maio de 2009.
 
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Sobre o mistério do despertar individual para a sabedoria do universo, leia a edição luso-brasileira de “Luz no Caminho”, de M. C.
 
 
Com tradução, prólogo e notas de Carlos Cardoso Aveline, a obra tem sete capítulos, 85 páginas, e foi publicada em 2014 por “The Aquarian Theosophist”.
 
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