Como Funciona a Inspiração Interna do Chela ou Discípulo
Helena P. Blavatsky
H. P. Blavatsky (1831-1891)
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O texto a seguir foi traduzido de
“Theosophical Articles”, de Helena P.
Blavatsky, uma coletânea em três volumes
publicada por The Theosophy Company, Los
Angeles, EUA, 1981. Ver volume I, páginas
295 a 298. O artigo foi publicado originalmente
na Índia sob o título de “Are Chelas ‘Mediums’?”,
na edição de junho de 1884 de The Theosophist.
(CCA)
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De acordo com a última edição do Imperial Dictionary, de John Ogilvie, um médium “é uma pessoa através da qual se diz que a ação de outro ser é manifestada e transmitida por magnetismo animal, ou uma pessoa através da qual alega-se que são feitas manifestações espirituais, e especialmente alguém de quem se afirma ser capaz de manter contato com os espíritos dos mortos”.
Como os ocultistas não acreditam em qualquer comunicação com os “espíritos dos mortos” no sentido comum do termo, pela simples razão de que sabem que os espíritos dos “mortos” não podem vir e não vêm comunicar-se conosco – e já que a expressão acima “por magnetismo animal” provavelmente teria sido modificada, se o editor do Imperial Dictionary fosse ocultista, nós, por esse motivo, só nos ocupamos da primeira parte da definição da palavra “médium”, que afirma: “é uma pessoa através da qual se diz que a ação de outro ser é manifestada e transmitida”; e gostaríamos de acrescentar: “Pela vontade ativa daquele outro ser, seja consciente ou inconscientemente.”
Seria extremamente difícil encontrar um ser humano na terra que não pudesse ser mais ou menos influenciado pelo “magnetismo animal” ou pela Vontade ativa (que envia aquele “magnetismo”) de outra pessoa. Se o general admirado cavalga no front da batalha, todos os soldados se tornam seus “médiuns”. Eles ficam cheios de entusiasmo, seguem-no sem medo e atacam a mortal artilharia inimiga. Um impulso comum permeia todos eles; cada um se torna “médium” de outro, o covarde fica cheio de heroísmo, e só quem não é médium de modo algum e portanto é insensível a influências morais epidêmicas ou endêmicas abrirá uma exceção, afirmará sua independência e fugirá.
O “pregador da fé” se erguerá em seu púlpito e, ainda que diga o absurdo mais incongruente, seus gestos e o tom de lamentação da sua voz serão suficientemente impressionantes para produzir uma “mudança no coração” pelo menos da parte feminina da sua congregação, e se ele for um homem poderoso, até os “céticos que vieram para rir-se ficarão para rezar”. As pessoas vão ao teatro e derramam lágrimas ou “rebentam” de tanto rir, de acordo com o caráter do espetáculo; uma apresentação de mímica, uma tragédia ou comédia. Não há nenhum homem, exceto um autêntico débil mental, cujas emoções e consequentemente cujas ações não sejam influenciadas de um ou de outro modo, e assim a ação de outro é manifestada ou transmitida através dele. Todos os homens, mulheres e crianças são, portanto, médiuns, e uma pessoa que não seja médium é um monstro, um aborto da natureza; porque está fora do âmbito da humanidade.
Assim, dificilmente a definição acima pode ser considerada suficiente para expressar o significado da palavra “médium” no uso popular do termo, a menos que acrescentemos algumas palavras, dizendo: “Um médium é uma pessoa através da qual se diz que é manifestada e transmitida a ação de outro ser em uma proporção anormal pela vontade ativa daquele outro ser, seja consciente ou inconscientemente.” Isso reduz o número de “médiuns” no mundo a uma quantidade proporcional ao espaço ao redor do qual traçamos o limite entre o normal e o anormal, e será tão difícil determinar quem é e quem não é um médium como dizer onde termina a sanidade e começa a insanidade. Todo homem tem suas pequenas “fraquezas”, e todo homem tem sua pequena “mediunidade”; isto é, algum ponto vulnerável, pelo qual pode ser pego de surpresa. No primeiro caso, ele não pode ser considerado realmente insano; e no segundo, não pode ser chamado de “médium”. As opiniões frequentemente diferem em relação a saber se um homem está insano ou não, e elas também diferem quanto à sua mediunidade. Na vida prática um homem pode ser bastante excêntrico sem ser considerado insano, até que sua insanidade chegue a um grau em que ele já não sabe o que está fazendo e é, portanto, incapaz de cuidar de si mesmo ou dos seus assuntos.
Podemos aplicar a mesma linha de raciocínio aos médiuns, e dizer que só serão considerados médiuns aqueles que permitem que outros seres os influenciem da maneira descrita acima com uma intensidade tal que eles perdem o seu autocontrole e não têm mais poder ou vontade próprios para regular suas próprias ações. Esta renúncia ao autocontrole pode ser ativa ou passiva, consciente ou inconsciente, voluntária ou involuntária, e difere conforme a natureza dos seres que exercem a mencionada influência ativa sobre o médium. Uma pessoa pode submeter consciente e voluntariamente sua vontade a outro ser e tornar-se seu escravo. Este outro ser pode ser humano, e o médium então será seu servidor obediente, e pode ser usado por ele com objetivos bons ou maus. Este outro “ser” pode ser uma ideia, como amor, ganância, ciúme, avareza ou alguma outra paixão, e o efeito sobre o médium será proporcional à força da ideia e à quantidade de autocontrole que permanece com o médium. Este “outro ser” pode ser um elementar ou um Elemental [1], e o pobre médium pode tornar-se epilético, maníaco ou criminoso. Este “outro ser” pode ser o princípio superior do próprio homem [2], esteja ele sozinho ou colocado em contato com outro raio do princípio universal e espiritual coletivo, e o médium será então um grande gênio, um escritor, um poeta, um artista, um músico, um inventor e assim por diante. Este “outro ser” pode ser um daqueles seres sublimes conhecidos como Mahatmas, e o médium consciente e voluntário será, então, qualificado como seu “Chela”.
Além disso, uma pessoa pode nunca ter ouvido em sua vida a palavra “médium” e ainda assim ser um forte médium, embora seja completamente inconsciente do fato. Suas ações podem ser influenciadas de modo mais ou menos inconsciente pelo seu ambiente externo visível ou invisível. Pode tornar-se vítima de Elementares e Elementais, mesmo sem saber o significado destas palavras, e consequentemente pode tornar-se um ladrão, um assassino, um estuprador, um bêbado ou degolador, e tem sido comprovado que frequentemente os crimes se tornam epidêmicos; e também ele pode ser levado por certas influências invisíveis a fazer ações que não são de modo algum coerentes com o seu caráter tal como ele era conhecido previamente. Ele pode ser um grande mentiroso e, em determinada situação, devido a alguma influência invisível, ser levado a falar a verdade; pode ser normalmente muito temeroso e no entanto, em alguma grande ocasião, no calor do momento, cometer um ato de heroísmo; pode ser um ladrão e vagabundo que anda pelas ruas e subitamente fazer uma ação generosa, etc.
Ainda mais: um médium pode conhecer a fonte de onde vem a influência, ou, em termos mais explícitos, a natureza do ser cuja ação é transmitida através dele, ou ele pode não saber disso. Ele pode estar sob a influência do seu próprio sétimo princípio e imaginar que está em contato com um Jesus Cristo pessoal, ou um santo; pode estar em contato com o raio “intelectual” de Shakespeare e escrever poesia shakespeareana, e ao mesmo tempo imaginar que o espírito pessoal de Shakespeare está escrevendo através dele, e o simples fato de ele acreditar nisso ou naquilo não tornará sua poesia melhor ou pior. Ele pode estar influenciado por algum Adepto no sentido de escrever uma grande obra científica e ignorar completamente a fonte da sua inspiração, ou talvez imaginar que foi o “espírito” de Faraday ou de Lorde Bacon [3] que estava escrevendo através dele, enquanto na verdade estava atuando todo o tempo como um “chela”, embora ignorasse o fato.
De tudo isso se conclui que o exercício da mediunidade consiste na renúncia mais ou menos completa do autocontrole, e a natureza boa ou má deste exercício depende inteiramente do uso que é feito dele e do propósito com o qual ele é realizado. Isso, por sua vez, depende do grau de conhecimento que a pessoa mediúnica possui em relação à natureza do ser sob cujos cuidados ela deixa, voluntária ou involuntariamente, durante algum tempo, a guarda das suas funções físicas ou intelectuais. A pessoa que confia indiscriminadamente estas funções à influência de qualquer força desconhecida é indubitavelmente “excêntrica”, e não pode ser considerada menos insana que alguém que confie seu dinheiro e suas propriedades ao primeiro estranho ou vagabundo que lhe peça isso. De vez em quando encontramos tais pessoas, embora elas sejam relativamente raras; e elas são normalmente conhecidas pelo seu olhar fixo idiota e pelo fanatismo com que se apegam a sua ignorância. Ao invés de acusá-las, devemos sentir piedade por estas pessoas, e se isto for possível elas devem ser esclarecidas em relação ao perigo que estão correndo. Mas convém deixar que o leitor – depois de considerar adequadamente o que foi dito acima – decida por si mesmo a questão sobre se um chela, que empresta consciente e voluntariamente, durante certo tempo, suas funções mentais a um ser superior que ele conhece, e em cuja pureza de motivações, honestidade de propósito, inteligência, sabedoria e poder ele tem total confiança, pode ser considerado um “médium” no sentido vulgar do termo.
NOTAS:
[1] Os elementares – “elementaries” – são as “cascas” ou “almas” de pessoas mortas que tiveram vida perversa e maldosa, e que por isso perderam contato com seus níveis superiores de consciência. Os elementais – “elementals” – são os espíritos da natureza, desenvolvidos nos seus diversos elementos, terra, água, ar e fogo. De acordo com os cabalistas, são os gnomos (da terra), as ondinas (da água), os silfos (do ar), e as salamandras (do fogo). A definição de HPB sobre elementais, no entanto, é muito mais ampla e leva em conta suas inúmeras variedades: “Eles são centros de força ou energia sobre os quais nós atuamos ao pensar e através de outras movimentações corporais”, diz ela em Collected Writings (TPH, Adyar, Índia, volume X, p. 104). Ela diz ainda (mesmo volume, p. 105): “O mundo elemental interpenetra o nosso, e está portanto eternamente presente no sistema humano.” (CCA)
[2] Eu superior: Atma, ou Atma-Budhi. (CCA)
[3] Michael Faraday (1791-1867) foi um físico e químico inglês que descobriu a indução eletromagnética e formulou as bases da teoria moderna sobre campo magnético. Faraday se qualificava como um ‘filósofo da natureza’. Francis Bacon (1561-1626), já mencionado acima, foi chanceler da Inglaterra, filósofo e criador do método científico moderno e experimental. Bacon foi um dos grandes pensadores e formuladores da transição da cultura medieval para a cultura moderna. (CCA)
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Sobre o mistério do despertar individual para a sabedoria do universo, leia a edição luso-brasileira de “Luz no Caminho”, de M. C.
Com tradução, prólogo e notas de Carlos Cardoso Aveline, a obra tem sete capítulos, 85 páginas, e foi publicada em 2014 por “The Aquarian Theosophist”.
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