A Flexibilidade e a Renúncia
Estão Entre os Fatores Necessários
Carlos Cardoso Aveline
Os círculos concêntricos da imagem
acima simbolizam a capacidade de concentração
Uma mente concentrada é desejável porque nela existem paz interior e um bem-estar emocional durável. A concentração surge com naturalidade para aquele cujos horizontes mentais são suficientemente amplos.
O raciocínio é bem-vindo, e o pensamento, livre. A concentração autêntica permite que a mente examine contrastes, conflitos e alternativas. Ela coloca cada um deles no contexto maior de uma visão universal da vida.
A escada de ouro da tradição teosófica recomenda uma mira constante no ideal de progresso e perfeição humanos – e uma mente aberta.[1] Ela propõe tanto a perseverança como o horizonte amplo. A firmeza e a flexibilidade são igualmente necessárias. A concentração nos conecta com o ponto central na roda da vida: a visão universal do mundo nos permite enxergar o Todo.
A Vida é Concêntrica
Astronomicamente, o sol é o centro do nosso sistema local de planetas. Desde Mercúrio até Plutão, cada planeta percorre o seu próprio círculo ovalado em torno da nossa estrela de quinta grandeza. O sistema solar é um conjunto de círculos concêntricos.
Psicologicamente, cada indivíduo consciente se vê como um centro ao redor do qual a vida se desenvolve em círculos, maiores ou menores, mais próximos ou mais distantes. Assim, tanto a vida planetária e universal como a existência individual são circulares no espaço e cíclicas no tempo.
Os sete princípios ou níveis da consciência humana podem ser visualizados como seis círculos concêntricos vibrando dinamicamente em torno do sétimo princípio, Atma.
Espaço e tempo são inseparáveis. A vida é concêntrica no espaço físico, no espaço da alma, e também na dimensão do tempo.
No espaço, denso e sutil, o universo inteiro parece movimentar-se em torno do ponto do cosmos em que vivemos.
No tempo (objetivo e subjetivo), o passado e o futuro são infinitos. Eles parecem posicionar-se ao redor do ponto específico que ocupamos na linha cronológica, ou seja, o nosso instante presente. O Aqui nos permite compreender o Espaço Infinito, assim como o Agora é o ponto de observação do Tempo Eterno.
De que modo o indivíduo pode administrar com eficiência a sua presença no universo? Sua existência é passageira e cíclica. Devido à lei da reencarnação, suas oportunidades cármicas são intermitentes. Ele deve tomar o máximo de consciência em cada vida, até que em determinado momento consegue compreender o quebra-cabeças do desapego e da sabedoria, e erguer-se acima das marés automáticas da existência.
Um primeiro passo é optar entre ter luz própria ou usar a luz dos outros. Se escolher uma atitude passiva, ele será o espectador da sua própria existência. Suas ações, ditadas por fatos externos, serão dispersivas. Sem luz própria, ele terá dificuldades para construir qualquer coisa. Seu estado de consciência mudará sempre de acordo com as marés do carma, e seus esforços inconstantes anularão uns aos outros. Ao trocar continuamente de direção, ele não avança para lugar algum. Mas quando adotar uma meta clara e elevada, desenvolverá uma força de vontade maior que as oscilações de curto prazo.
Uma Intimidade com o Infinito
Podemos praticar seriamente concentração quando a nossa visão de mundo é suficientemente ampla. Em filosofia esotérica, a concentração surge de uma intimidade com o infinito, ou seja, o território insondável em que vive o eu superior, ou alma imortal.
Quando nosso horizonte é imenso, a noção de espaço é infinita e a noção de tempo, eterna. Então é possível compreender o mantra japonês Namu Amida Butsu, que significa: “Eu me refugio na luz eterna e na vida infinita”. [2]
A partir desse momento é correto começar a pensar em verdadeira concentração. O ponto central define a condição de toda a roda da vida. Cabe dedicar a ele a nossa atenção. A renúncia e a humildade, dois fatores essenciais, resultam da proximidade pessoal com o infinito. Saber que somos pequenos – e que a oportunidade hoje ao nosso alcance para agir corretamente é breve – torna possível reunir as nossas forças e aplicá-las no mesmo ponto durante o tempo necessário para que haja bons resultados.
A prática da concentração é dinâmica. Se olharmos para ela como se fosse uma bicicleta, a roda da frente será o foco mental claro. O guidão e a roda dianteira devem fazer o tempo todo pequenos ajustes de rumo, mas precisam ser estáveis na sua direção geral. A roda de trás será a renúncia: ela deixa para trás o que passou. Para avançar numa direção definida, o estudante de filosofia deve abrir mão das outras direções. Optar pelo que é certo implica deixar de lado o que sabemos que é errado. Também é necessário colocar no seu devido lugar os fatores cuja importância não chega a ser primordial.
O aprendizado da concentração ocorre no dia-a-dia. Com o tempo, aquilo que pensávamos ser durável se mostra provisório. Muito do que nos parecia verdadeiro se mostra falso. Embora a sensação de perda não seja agradável, a decisão de aprender com as decepções abre as portas da libertação interior. Quando as metas ilusórias se desmancham no ar, a realidade mais profunda se torna visível, e o indivíduo reduz radicalmente a quantidade de erros que comete na vida. Então surge pouco a pouco, como um novo amanhecer, a bênção da felicidade incondicional.
NOTAS:
[1] Leia o artigo “A Escada de Ouro”, de Carlos Cardoso Aveline, que pode ser encontrado em nossos websites associados.
[2] Veja o texto “Namu Amida Butsu”, de Carlos Cardoso Aveline, disponível em nossos websites associados.
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