O Otimismo Clássico de
Affonso Celso Antecipa o Futuro
Carlos Cardoso Aveline
“Na base de toda corrupção – subornos, corrupção
pública, todo tipo de demagogia (…) – estão uma
cegueira espiritual e uma ausência de valor espiritual
do próprio indivíduo. (…) É por isso que um regime
político incapaz de alimentar no povo uma percepção
do seu próprio valor está condenado a desintegrar-se,
finalmente, devido ao triunfo do egoísmo privado sobre
o interesse público, e da vulgaridade sobre o espírito.”
(Ivan A. Il’in) [1]
O escritor brasileiro Affonso Celso criou junto com Augusto de Lima uma tendência literária chamada “filosofismo poético”. Celso é mais conhecido do público amplo pelo seu livro “Por Que Me Ufano do Meu País”, um clássico publicado pela primeira vez em 1900.
A obra é um canto em prosa às belezas e às vantagens do “país do futuro”, o “gigante adormecido em berço esplêndido”. [2]
No capítulo 22, Affonso Celso descreve dez traços do caráter nacional brasileiro:
1) Sentimento de independência.
2) Hospitalidade.
3) Afeição à ordem, à paz, ao melhoramento.
4) Paciência e resignação.
5) Doçura, generosidade, desinteresse.
6) Escrúpulo no cumprimento das obrigações assumidas.
7) Espírito extremo de caridade.
8) Abertura mental que degenera, às vezes, em imitação do estrangeiro.
9) Tolerância; ausência de preconceitos de raça, cor, religião.
10) Honradez no desempenho de funções públicas ou particulares.
É sobretudo neste último ponto que o visionário Affonso Celso se demora mais.
Pode-se debater se ele estava enxergando o momento histórico dos anos 1880-1900, ou se ele via algum ponto mais avançado no tempo, provavelmente no século 21.
Comparado com o momento atual do país, o texto talvez desperte saudades de um passado ideal. Mas as palavras de Affonso Celso podem ser resgatadas como uma profecia precisa e bem formulada.
Ele escreveu:
“A estatística dos crimes depõe muito em favor dos nossos costumes. Viaja-se pelo sertão, sem armas, com plena segurança, topando sempre gente simples, honesta, serviçal. Os homens de Estado costumam deixar o poder mais pobres do que quando nele entram. Magistrados subalternos, insuficientemente remunerados, sustentam terríveis lutas obscuras, em prol da justiça, contra potentados locais. Casos de venalidade enumeram-se raríssimos, geralmente profligados. A República apoderou-se de surpresa dos arquivos do Império: nada encontrou que o pudesse desabonar. Por ocasião desta revolução, senadores ficaram tão pobres que o novo regime lhes ofereceu pensões. Ao Imperador, que governara cinquenta anos, assegurou a Constituição Republicana meios de subsistência de que ele precisava, mas não aceitou. Quase todos os homens políticos brasileiros legam a miséria às suas famílias. Qual o que já se locupletou à custa do dinheiro público?”
Esta última pergunta parece mais atual do que nunca.
O tempo não passa em vão, e o povo brasileiro está a ganhar experiência histórica com tudo o que lhe acontece. Affonso Celso descreveu em linhas gerais o potencial superior e sagrado não só do Brasil, mas de outros povos também.
NOTAS:
[1] Do livro “The Essence of Legal Consciousness”, de Ivan A. Il’in: Wildy, Simmonds & Hill Publishing, 2014, Reino Unido, 391 pp., ver p. 266.
[2] “Por Que Me Ufano do Meu País”, Affonso Celso, Editora Expressão e Cultura, Rio de Janeiro, 2001, edição de bolso, 238 pp., ver pp. 118-119.
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Uma versão anterior do artigo acima foi publicada de modo anônimo na edição de dezembro de 2007 de “O Teosofista”, sob o título “A Honestidade dos Políticos Brasileiros”.
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